Estar na Pele da Letícia: Página 02

Tô num dia de merda. Sentada num banco do shopping esperando meus amigos que estão sempre atrasados (eu amo vocês mas comprem um relógio, pelo amor de Deus).

Meu embate com as ondas da depressão teria um desfecho simples se eu desse a ela a chance de vencer essa batalha: ficaria na cama chorando ao som das minhas playlists mais tristes. Deixaria as janelas fechadas por dias e me esconderia debaixo das cobertas. Tomaria meu remédio para emergências enquanto me desfaço em lágrimas. 

Teria que ficar rasgando papéis até se tornarem fiapos porque tenho vontade de atirar coisas na parede para ver se me livro de pelo menos 1% da angústia que me consome e me devora e me faz sentir como o ser mais desprezível que já existiu. 

Mas cá estou. Tentando segurar as pontas por mais algumas horas. Tentando comer um hambúrguer com os amigos como uma jovem normal. Tentando, tentando e tentando todo santo dia não ser vencida por esses transtornos que tanto odeio. 

Fico observando as pessoas passarem por mim com ares de quem acha a vida leve. Que graça né? Uma mulher com seu bebê no colo, um casal de adolescentes, um senhor comendo uma casquinha de sorvete sozinho, um pai se esforçando para que o filho fique parado por uns minutos para uma foto. 

É claro que eles têm seus problemas. Questões a serem resolvidas. Conflitos internos com os quais lidar. Só que, diferente de mim, eles conseguem estar aqui sem vivenciar o puro pavor de ter uma crise nos próximos 15 minutos. De me tornar uma pessoa completamente diferente de quem eu sou e não saber quando vou voltar a ser eu mesma de novo. 

Mergulhar nesse abismo não é algo que tenha volta. Não tem. Uma crise quando se instala deixa cicatrizes. Deixa a dor de não conseguir vencer o invencível. 

É bem evidente que nesse exato momento eu não consigo ser positiva e dizer que tudo vai ficar bem.

O que mudou nos últimos anos é que eu me perdoo por isso. Todos temos dias ruins e esse é o meu.

E eu estou ciente de que o meu amanhã provavelmente não vai ser dos melhores, as crises não se resolvem com o passar de uma noite. Mas digo aqui para registro geral que aceito perder essa luta. Quando eu me reconstruir estarei pronta para voltar a enfrentar isso. 

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Letícia Cais

Letícia é estudante de Direito e autora de “Gira, o livro”. Canceriana, sente tudo com intensidade. Começou a publicar seus textos na internet em 2016 e nunca mais parou.

Apaixonada pela escrita e por tudo que ela proporciona, encontrou nas palavras um refúgio para suas reflexões.