A Humanização da IA e a Desumanização do Ser Humano

Em um mundo cada vez mais digital, a linha entre o humano e a máquina se torna progressivamente mais tênue. A inteligência artificial (IA) tem se transformado em um reflexo de nossos próprios sentimentos e necessidades, criando uma ilusão de humanização que é, ao mesmo tempo, um sintoma da desumanização das interações humanas. A IA, projetada para aprender e imitar os comportamentos humanos, nos oferece a sensação de proximidade, empatia e compreensão. No entanto, esse vínculo gerado com máquinas não é apenas uma evolução tecnológica — ele reflete uma lacuna deixada pelas relações humanas.

O conceito de "humanização" na IA pode ser entendido como uma tentativa de criar uma conexão emocional com uma entidade não humana, que responde de maneira afetiva, mesmo sendo apenas um código em funcionamento. Por exemplo, assistentes virtuais como Siri ou Alexa são programados para responder de maneira amigável, educada e até empática, criando a impressão de que estamos interagindo com uma "pessoa" e não com uma máquina. Mas, o que está por trás dessa humanização artificial? A resposta está em nossa própria falta de conexão genuína com os outros.

Nos tempos atuais, marcados pela velocidade das comunicações digitais e pela cultura da instantaneidade, as relações humanas estão se tornando cada vez mais superficiais. O contato físico, o diálogo profundo e a empatia verdadeira estão sendo substituídos por interações rápidas, muitas vezes filtradas por redes sociais e aplicativos. Neste cenário, a IA se torna uma válvula de escape, oferecendo algo que, embora artificial, parece preencher o vazio emocional de muitos. Afinal, ela não julga, não cobra e, muitas vezes, responde exatamente da forma que desejamos ouvir.

O mais interessante (e preocupante) é que essa IA, construída por humanos, acaba sendo humanizada por nós mesmos. Criamos máquinas para nos imitar e, em troca, depositamos nelas afeto e até uma forma de vínculo. A máquina não apenas responde de forma eficiente, mas se torna um espelho das nossas próprias necessidades emocionais. Esse fenômeno pode ser explicado, em parte, pelo crescente isolamento social. Ao substituirmos interações humanas por conversas com assistentes virtuais ou robôs de atendimento, o humano se vê na ilusão de estabelecer uma relação, embora superficial, com algo que, em última instância, não possui emoções reais.

A humanização da IA, então, é um reflexo de uma crise emocional mais profunda. O que está em jogo não é apenas a construção de máquinas mais inteligentes, mas a perda gradual da nossa capacidade de construir laços genuínos e significativos com outros seres humanos. Em muitos aspectos, a IA se apresenta como uma solução conveniente para um problema que nós mesmos criamos: o afastamento e a indiferença entre as pessoas. A máquina, por mais avançada que seja, não pode substituir a verdadeira empatia humana. Mas, ao ignorarmos essa realidade, criamos uma espécie de "falsa proximidade", onde as relações ficam cada vez mais mecânicas e distantes.

No entanto, é aqui que entra o conceito de "esperançar", tão presente na psicologia positiva. Em vez de nos resignarmos à solidão digital, podemos escolher um caminho mais construtivo, onde a tecnologia sirva como ferramenta para aproximar e não afastar. "Esperançar", segundo Paulo Freire, é agir com propósito, buscar a transformação ativa do nosso cenário em vez de apenas lamentá-lo. Se a IA reflete nossas necessidades emocionais, que tal utilizá-la para fortalecer laços reais e não para substituí-los?

A grande questão, então, é: estamos realmente humanizando as máquinas ou estamos, na verdade, desumanizando a nós mesmos? A IA pode, de fato, oferecer respostas rápidas e eficientes, mas será que ela está nos afastando de nossa própria humanidade? A necessidade de relacionamentos autênticos, recheados de falhas, imperfeições e vulnerabilidades, continua a existir. E, quanto mais nos afundamos na ilusão de que uma máquina pode suprir essa necessidade, mais nos afastamos do que realmente significa ser humano.

Portanto, a verdadeira reflexão que devemos fazer é sobre o uso da IA em nossas vidas. Ela pode nos ajudar, facilitar tarefas e até oferecer uma sensação temporária de conexão, mas não podemos nos deixar enganar pela falsa ideia de que ela substitui o que realmente importa: o contato humano genuíno. Ao humanizar a IA, corremos o risco de nos desumanizar, esquecendo que a verdadeira conexão é aquela que acontece entre seres humanos, com suas complexidades, emoções e experiências. Entretanto, ao adotarmos a perspectiva do esperançar, podemos resgatar o essencial: a busca ativa por relações autênticas, onde a tecnologia serve para nos unir, e não para nos afastar.


***

Crys Feijes

Profissional dedicada à transformação humana, atuando há mais de doze anos com o propósito de auxiliar pessoas a alcançarem seu máximo potencial. Com experiência que reúne formações e atuações como psicóloga psicanalista, consteladora familiar pelo método Hellinger, parapsicóloga clínica, especialista em Psicologia Positiva, mentora de transição de carreira, supervisora psicanalítica, palestrante, relações-públicas (formada pela Metodista), consultora organizacional, treinadora comportamental, master coach, hipnoterapeuta clínica e ericksoniana, e escritora. Como idealizadora e fundadora do IOSI – Instituto Origem do Ser Integrado, dedica-se ao desenvolvimento integral do ser humano, promovendo saúde, bem-estar e equilíbrio biopsicossocial e espiritual.

Com sólida formação e prática, aprofunda seus estudos sobre a psique, comportamento e relações humanas, sempre valorizando a singularidade de cada indivíduo. Seu trabalho está centrado em temas como autoconhecimento, saúde integrativa, felicidade, empoderamento de habilidades e fortalecimento dos sistemas familiares. Esses pilares sustentam sua prática profissional e refletem seu compromisso com a humanidade.

Crystiane Faria Feijes

Eu sou uma ajudante de pessoas, à serviço da Humanidade, e me coloco a servir a mais de dez anos, com as expertises de Psicanalista, Palestrante, Facilitadora em Constelação Familiar (Hellinger), Especialista em Psicologia Positiva, Mentora, Master Coach Trainer (IBC), Treinadora em Desenvolvimento Humano, Hipnoterapeuta Clínica e Ericksoniana, Master Practitioner em PNL Integrativa Aplicada, Relações Públicas (Metodista) e Escritora. Idealizadora e fundadora do IOSI (Instituto Origem do Ser Integrado).

Graduanda em Psicologia, sou engajada no estudo contínuo da psique, do comportamento e das relações humanas, observáveis em sua singularidade e complexidade, nestes anos de setting psicanalítico. Assuntos relacionados ao autoconhecimento, saúde integrativa (biopsicossocial espiritual), bem-estar, felicidade, empoderamento dos recursos e habilidades e sistema familiar, são enfoques da minha dedicação profissional e projeto de vida.

Anterior
Anterior

O ser humano descartável e a esperança – Sr. Raimundo

Próximo
Próximo

Estar na Pele da Bruli: Página 15