Perdão ou auto responsabilidade
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Muitas vezes escutamos que o perdão é liberta-dor, que aquele que concede o perdão, se livra desta conexão de sofrimento, que se trata muito mais daquele que dá, do que aquele que recebe este ato.
Eu vou iniciar com as forças de caráter, a virtude que abarca o perdão, é a Temperança.
Existe uma crença que diz: o fraco jamais perdoa, o perdão é uma das características do forte.
Os mártires agem neste comportamento, para restaurar a paz.
Só para reflexão: a paz é um objetivo de todos? Quando falamos da paz mundial, estamos dizendo que todos querem a paz, isto é uma verdade?
O que entender por paz? É o ato de perdoar?
Cada um de nós vive seu caos e sua paz, à medida que compreende as próprias questões. Penso que até o último suspiro de vida, encontraremos o caos e a paz em si mesmo.
O ser humano vive internamente em conflito, e isto é o ponto que faz com que possamos avançar em nossa evolução constante. O conflito é diferente do confronto.
Toda vez que colocamos um pensamento, uma emoção, um comportamento em avaliação, estamos conflitando entre o certo e errado para nós, e este ato nos dá o senso de realidade das nossas ações no mundo, nas relações com o outro e consigo mesmo.
“Confrontar é sair de si, para ir ao outro, é um ato que na maioria das vezes revela o desrespeito com a unicidade. Cada um é de um jeito, a nossa formação vai muito além da leitura e julgamento que o outro faz, somos uma complexidade de vivências consciente e inconsciente, sabemos inclusive, muito pouco de nós, como poderia a outra pessoa saber quem sou? ”
Como se colocar neste lugar de “aquele que perdoa”?
Este é o forte? Ou o arrogante? O dono da razão? O politicamente correto?
Quem é o detentor da verdade, para julgar a atitude do outro, com tamanha maestria e coerência para dar o veredito de: eu te perdoo.
Se falarmos dos doutores da lei, desde que o mundo é mundo, há equívocos, predileções, jogo de poder, interesses prioritários, e tantas outras questões que o ser humano leva em consideração, como seu favorecimento em detrimento ao certo e ao outro.
Quando uma pessoa se direciona a outra para pedir perdão, penso que em sua avaliação se considera errada, e a outra pessoa certa. O que seria errado, quando somos fruto do meio, representantes de um sistema familiar e social, eternos aprendizes nesta jornada chamada vida.
Muitas vezes o que chamamos de erro, torna-se rapidamente em aprendizado. A partir daquilo que realizamos, podemos observar e avaliar, para a melhoria constante de nossas ações e condição humana.
Os estudos falam sobre os 3 tipos de perdão:
Autoperdão: honrar e respeitar a própria história.
Perdoar o outro: aceitar a dualidade do ser humano; equilíbrio.
Pedir perdão: 2 causas: consciente e inconsciente.
Até aqui, é o perdão como conhecemos, mas quero te levar a ampliar sua compreensão quanto ao assunto.
Se todos somos aprendizes em si mesmo, da caminhada humana, na evolução diária de nossas virtudes e vicissitudes, o que fazemos ao darmos um passo neste sentido, é reconhecer que as atitudes de ontem, foram as possíveis, o que sabíamos fazer e agir, e agora ao aprendermos algo novo, com nossas próprias ações, podemos decidir fazer um pouco diferente, melhor, de outro jeito.
Entendo como responsabilidade, e esta maturidade em reconhecer as próprias ações, implica em reparar algo, em se comprometer com a transformação e mudança de algo feito, e aqui vejo verdadeiramente uma possibilidade de apaziguar o conflito interno.
“Reconhecer e dizer ao outro: eu sinto muito, é trazer para si a responsabilidade que compete a cada um em uma relação, eu assumo os meus 50%, e deixo o outro com os seus 50%, o que a pessoa irá decidir, é uma escolha dela, todos crescem nesta atitude.”
Quando me coloco a pedir perdão, retiro a minha responsabilidade, delego ao outro: eu peço, se ele quiser dar, ótimo, mas aí já é com o outro, não se trata mais de mim. É uma relação de desequilíbrio, porque um se coloca pequeno e o outro grande.
Na relação de adultos, ambos são iguais, mas na mente inconsciente, se peço perdão, já fiz minha parte, e a penitência me absolve de algo, fico livre, mas não gera ação, e os tormentos internos reincidem, e a falta de ação, leva muitas pessoas a enlouquecerem, pela máxima culpa que carregam dentro de si.
Então, quem perdoa é o forte? Isto se trata de uma crença fortalecedora ou limitante?
“Talvez, possamos mudar a palavra forte, para coragem de assumir as próprias escolhas, e perdão por responsabilidade. Aqui se trata de amadurecimento, reconhecer luz e sombra. O caminho do autoconhecimento é o que de fato nos leva a libertação de crenças centrais, intermediárias, valores impostos, ética ferida, distorção de imagem, e tudo o que nos aprisiona.”
Te convido a pensar mais profundamente sobre o perdão, e podemos em breve, conversar um pouco mais sobre este assunto: perdão ou auto responsabilidade.
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Crystiane Faria Feijes
Uma profissional que olha para a mente humana: consciente e inconsciente, as relações intra e interpessoais, a família, a estrutura da formação da psique (traumas, sintomas, dores e doenças), as forças de caráter, saúde mental, sonhos, sucesso, sentido da vida, são assuntos recorrentes nestes 10 anos de atendimentos psicanalítico e sistêmico. E quanto mais ela se coloco a serviço deste algo maior, que envolve a todos nós, mais observa o universo brilhante, e ainda inexplorável que somos.
Existem histórias que começam antes mesmo do primeiro encontro. Histórias que se escrevem nas faltas, nos vazios, nas tentativas de se reconstruir depois do amor que não deu certo. Estar à Procura é sobre isso: relatos de quem, de uma maneira ou de outra, busca aquela parte que está faltando — e tenta preencher o vazio que machuca.