O impacto dos estereótipos de gênero na saúde da mente
[Cenário]
Em um mundo que há muito tempo se define por padrões binários de gênero, cresce a conscientização sobre a diversidade e a compreensão de que a identidade de gênero não se limita a categorias estritamente masculinas ou femininas. No entanto, mesmo com os avanços na luta pelos direitos LGBTQIAPN+, pessoas intersexo, trans e não bináries continuam a enfrentar altos níveis de discriminação – o que tem um impacto significativo em sua saúde mental.
Entre os jovens hospitalizados nos Estados Unidos – que não se identificam com o sexo atribuído no nascimento –, 66% vivenciaram tentativas de suicídio ou automutilação em 2019. Em comparação, apenas 5% das pessoas sem transtornos de identidade de gênero são internadas pelos mesmos motivos, de acordo com um estudo da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), publicado no The Lancet Child & Adolescent Health*.
Foto: Shingi Rice / Unsplash
Em um estudo realizado na Suécia, entre os anos 1973–2003, a psiquiatra suíça Cecilia Dhejne observou que a avaliação destes dados na população trans, que realizou a cirurgia de redesignação, em comparação com a população em geral, é frequentemente distorcida para corroborar a ideia ou percepção equivocada de que a transição de gênero – ou a realização da cirurgia – teria causado níveis mais elevados de morbilidade e mortalidade, desconsiderando que tais taxas possam decorrer do estresse de minoria, fruto de discriminação e exclusão social, em vez das intervenções médicas de afirmação de gênero**.
A experiência de pertencer a uma identidade de gênero que desafia a norma social pode expor esses indivíduos a uma série de desafios emocionais. O estigma e o preconceito enraizados em instituições, sistemas de saúde e na sociedade em geral contribuem para altos níveis de ansiedade, depressão, estresse e outros problemas de saúde da mente. Antes da pandemia, 28% da população LGBTQIAPN+ do Brasil relatava ter diagnóstico de depressão; após a Covid-19, 42,7% desta população relatou o aumento de problemas ligados à saúde mental e 54% afirmam precisar de apoio psicológico (VoteLGBT+, 2020)***.
Pessoas intersexo, cujas características biológicas não se encaixam nas definições tradicionais de sexo masculino ou feminino, frequentemente, enfrentam uma falta de compreensão e aceitação, que podem levar a situações de isolamento e baixa autoestima. A falta de informação adequada sobre a intersexualidade muitas vezes leva a procedimentos médicos invasivos e desnecessários, deixando cicatrizes emocionais duradouras.
Da mesma forma, pessoas transexuais e não bináries enfrentam uma luta diária contra a transfobia e o preconceito de gênero. A negação da própria identidade e o não reconhecimento de seus nomes e pronomes escolhidos podem levar a um sentimento de desvalorização e marginalização.
A falta de acesso a cuidados de saúde culturalmente sensíveis e de qualidade, também, coloca esses indivíduos em maior risco de problemas de saúde mental.
Em 2019, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) conduziu a primeira coleta de dados sobre orientação sexual. No levantamento, 1,8% da população adulta se declarou homossexual ou bissexual. Entretanto, não foram levantados dados sobre aspectos de identidade de gênero, o que envolve categorias como pessoas trans e não bináries. Ao não identificar quantas pessoas pertencem a um determinado grupo em meio à população, essas ficam invisibilizadas, dificultando que se estabeleçam políticas públicas para esse grupo – e que se faça um trabalho de formação de profissionais para atender às suas necessidades.
A pressão social para se encaixar em padrões binários de gênero e a violência – que muitas vezes é direcionada a pessoas LGBTQIAPN+ – têm consequências devastadoras. É imprescindível que instituições, escolas, professores e profissionais de saúde estejam preparados para oferecer atendimento adequado e livre de discriminação. A boa notícia é que o IBGE anunciou, em 9 de outubro de 2023, o início da coleta das informações sobre identidade de gênero e orientação sexual na Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) 2023.
Este conteúdo faz parte do capítulo 6 - Gênero e identidade do livro “Sexualidade e Saúde da Mente”, disponível gratuitamente em
www.nozinteligencia.com.br/sexualidadeesaudedamente.
***
* www.thelancet.com/journals/lanchi/article/PIIS2352-4642(22)00280-2/fulltext.
** https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371%2Fjournal.pone.0016885.
***https://static1.squarespace.com/static/645a82ef72df1e50defcf770/t/6499f45988bc70512e8c591a/1687811273914/diagno%CC%81stico_LGBT_pandemia_completo.pdf
Realização: NOZ Inteligência e Instituto Bem do Estar
Sobre o Instituto Bem do Estar | O Instituto Bem do Estar é um negócio social sem fins lucrativos voltado à promoção da saúde da mente. Com o propósito de desafiar as pessoas a mudar o próprio comportamento em relação à saúde da mente, a organização colabora com a prevenção de doenças psicológicas e contribui para uma sociedade mais consciente e saudável. Para tal, possui três frentes de atuação, que visam CONSCIENTIZAR, por meio de ações que levam informações sobre os cuidados para uma saúde da mente de qualidade; CONECTAR, por meio de atividades práticas e imersivas, proporcionando ferramentas que contribuem com o desenvolvimento socioemocional individual e coletivo; e MOBILIZAR, gerando estatísticas e articulando agentes públicos e privados, via pesquisas e práticas de advocacy. www.bemdoestar.org
Sobre a NOZ Inteligência | A NOZ atua desde 2015 de forma personalizada para gerar conteúdo qualificado para empresas, projetos e causas. A consultoria trabalha conectado conhecimentos de Economia Comportamental, Pesquisa de Mercado, Planejamento Estratégico, Financeiro e de Marketing, para produzir informações e apoiar a tomada de decisão.
Para além do desenvolvimento de consultoria e projetos para empresas, a NOZ atua em estudos sociais em temáticas diversificadas como Cooperação, Educação, Saúde, Trabalho e Empreendedorismo, Maturidade (50+), Mulheres, Pessoas com Deficiência.
Existem histórias que começam antes mesmo do primeiro encontro. Histórias que se escrevem nas faltas, nos vazios, nas tentativas de se reconstruir depois do amor que não deu certo. Estar à Procura é sobre isso: relatos de quem, de uma maneira ou de outra, busca aquela parte que está faltando — e tenta preencher o vazio que machuca.