Sexualidade e sua pluralidade

Oguz Can/ Unspplash

Você já parou pra pensar quão complexa é a nossa sexualidade? Pois é, e sexualidade não tem a ver somente com sexo. Sexualidade engloba, sim, sexo, porém também identidades e papéis de gênero, prazer, intimidade e reprodução. É influenciada por fatores biológicos, psicológicos, sociais, culturais, econômicos, políticos, históricos e religiosos. Vivemos a sexualidade por meio de desejos, crenças, valores, pensamentos, sentimentos, atitudes, comportamentos e relacionamentos. E a sexualidade está diretamente ligada com a nossa saúde física e mental.

Saúde sexual pode ser entendida como um estado de bem-estar físico, emocional, mental e social, exigindo uma abordagem respeitosa, segura, prazerosa, consensual, sem coerção e violência.

Para falarmos sobre o assunto é importante sabermos alguns conceitos fundamentais. Você sabe qual é a diferença de orientação sexual e identidade de gênero? Orientação sexual está relacionada ao desejo afetivo e sexual que cada pessoa pode ter. Alguns tipos são heterossexual (atração pelo gênero oposto), homossexual (atração pelo mesmo gênero), bissexual (atração por ambos), assexual (atração por nenhum) e pansexual (atração por pessoas de qualquer gênero). Já a identidade de gênero é como a pessoa se sente em relação ao próprio gênero, que não está limitado somente ao sexo biológico de nascença, mas algo construído socialmente. É o jeito como nos reconhecemos e desejamos que os outros nos reconheçam. Na sociedade, o gênero está associado à divisão de papéis de cada indivíduo, interesses, acessos e necessidades. 

Frequentemente, pacientes levam para a terapia questões e temas relacionados à sexualidade, gênero e práticas sexuais que através do diálogo exploramos crenças, significados e dilemas sobre o assunto. E nós, profissionais da saúde da mente, temos como objetivo estimular um mergulho pelas vastas possibilidades de formas e significados desse imenso oceano que engloba a sexualidade. 

Segundo Foucault, a sexualidade nem sempre foi o que vivemos atualmente. Na antiguidade a sexualidade era diferente, e o que entendemos por transgressões eram vistas com naturalidade em algumas culturas, como por exemplo a iniciação sexual de jovens rapazes por homens mais velhos, ou o caso de mulheres que tinham intimidade sexual com outras mulheres. 

Outro exemplo de doutrinação da sexualidade foi no desenvolvimento do capitalismo e da classe burguesa no século XVII, quando se explorava ao máximo a força de trabalho, reduzindo o espaço para o prazer apenas para a produtividade da reprodução humana.

Nesse contexto, a homossexualidade era ameaçadora quando a prática não reprodutiva prejudicaria a esteira industrial. Por influência da igreja católica e a doutrinação, a sexualidade teve algumas alterações recebendo padrões de certo e errado. Tradições repressoras entendem a prática sexual como uma atividade marginal digna de punição. Vivemos uma doutrinação direcionada para a prática predominante encerrada ao casamento, monogâmica e heterossexual.

Devemos nos fazer um convite para a transformação da doutrinação e a desconstrução dos conceitos de certo e errado, utilizando o diálogo com pessoas que vivem estas práticas, buscando entender a sexualidade de forma mais singular e menos padronizada.

Precisamos questionar verdades absolutas e entendermos a pluralidade e singularidade da sexualidade. Atualmente, novos movimentos sociais como minorias sexuais e feministas estão lutando para conquistar espaços na construção de saberes sobre sexualidade, trazendo seus olhares e o diálogo sobre novas concepções, discursos e ética. Significados não podem ser fechados, estamos constantemente nos transformando e a nossa identidade sempre em movimento e aberta para o novo. Devemos reconhecer as singularidades de cada indivíduo legitimando suas escolhas, seus desejos e seu desenvolvimento humano.

Foucault, M. (2007). História da sexualidade, 2: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro: Graal.  


***

Ricardo  Milito

Diretor Científico do Instituto Bem do Estar. Psicólogo e administrador com experiência no segmento organizacional e projetos sociais. Curioso, observador e disposto a ajudar as pessoas buscarem respostas para suas questões. Acredita no potencial do ser humano.