Empatia, Compaixão e Burnout

Burnout, palavra da vez. Queimar até a exaustão. O ser humano, espécie que se aperfeiçoou nas possibilidades da contradição, vive o dilema entre os extremos de nunca sentir a chama da vida ou exaurir-se em autocombustão. 

Foto: fotografierende / Unsplash

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Se antes esse fenômeno de esgotamento físico e mental podia ser percebido, principalmente, em profissões de alta carga de stress, hoje esse leque se ampliou e estatisticamente mais e mais pessoas vêm relatando sintomas associados ao burnout. 

Estudos no campo da ciência contemplativa, especificamente nos temas da empatia e compaixão, concordam a respeito de dois processos relacionados ao burnout. O primeiro seria no tocante a uma das causas desse esgotamento que ocorre através da via da conexão empática com o sofrimento alheio, um fenômeno por um lado positivo e desejável, mas que a médio e longo prazo pode gerar consequências negativas a depender do manejo dessa conexão.

Sentimentos de culpa, pena, impotência e em casos extremos até desespero gerados pelo estabelecimento de uma conexão empática mas que não oferece possibilidades de ação.

Sentimentos que predominam quando não ocorre uma transmutação mínima e extremamente necessária da qualidade da resposta, que passa pela via das habilidades da compaixão. Essas habilidades quando treinadas e fortalecidas, por exemplo através de algumas práticas contemplativas, abrem mais possibilidades de ação, diminuindo o sofrimento e a sensação de esgotamento. 

Um segundo processo observado nas pesquisas relacionadas ao burnout, é a possibilidade do surgimento de sensações de aversão e afastamento. Como se num extremo oposto à fusão como sofrimento sem perspectiva de saída, surgisse uma recusa deliberada em testemunhar a realidade e o sofrimento alheio. 

À medida em que somos cada vez mais expostos à “hipernotificação” e “hipernoticiação” da vida, essa resposta de desligamento parece cada vez mais atrativa.

Queremos desligar os problemas puxando o fio da tomada do mundo. 

O mecanismo político percebeu esse fenômeno, e nos últimos tempos temos observado ainda mais a estratégia de aplicação de um bombardeamento de notícias catastróficas ou altamente polemizadoras no intuito de levar, e manter, o cidadão comum ao limiar da atenção e tensão. Estamos testemunhando a utilização de agentes estressores contínuos como ferramenta política. O desligamento da vida por burnout torna-se cada vez mais uma estratégia aplicada, sobretudo por governos que têm, por exemplo, a retirada de direitos e a exploração desenfreada do meio ambiente como premissas, uma vez que pessoas que não se importam com nada são mais facilmente manipuláveis. Passamos do estado de obsolescência programada das coisas para o estado de obsolescência programada das pessoas. 

Pois bem, quando nosso computador começa a apresentar problemas de funcionamento, antes de puxar o fio da tomada podemos tomar algumas atitudes menos drásticas. Por exemplo, fechar algumas abas abertas desnecessariamente, identificar o problema, limpar a sujeira. Podemos, enfim, gerar espaço. O mesmo se dá no processo de burnout. 

Tão importante quanto fortalecer habilidades para lidar com o sofrimento sem se fundir com os problemas, é identificar quais de fato são os que estão ao seu alcance para resolução imediata ou a médio prazo.

E existe uma enorme diferença entre essa identificação e o desligamento geral da tomada. A liberação de espaço nos nossos discos rígidos da mente permite movimento e clareza. Clareza possibilita discernimento para identificarmos e evitarmos situações que nos coloquem em estado de esgotamento. 

Temos a escolha de apagar a chama da vela antes que ela se consuma até o seu fim, para que tenhamos uma boa noite de sono, e para que no dia seguinte ainda nos reste vela. 


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Felipe Futada

Professor de Educação Física (USP) e trabalha em escolas da rede particular de São Paulo e em cursos de formação de professores.