Estar na Pele do Kenzo: Página 03

Ouvindo o silêncio

Já faz algum tempo que tenho evitado a escrita livre. Talvez “evitado” nem seja a melhor palavra. Normalmente, a gente evita aquilo que pode despertar o medo – um pesadelo, um trauma, uma ferida. Eu sei que não é o caso da escrita. 

Foto: Brandi Redd / Unsplash

Foto: Brandi Redd / Unsplash

Sei também que perdi um pouco a intimidade com a caneta e o papel, mas a pergunta que me faço hoje é: “o que esse silêncio está querendo me dizer?”

Será mesmo falta de tempo? Talvez a rotina da não-escrita tenha se sobressaído à da escrita? Será que a escrita não me ajuda mais? Ou sou eu quem não ajudo mais a escrita?


Hoje resolvi ajudar, fazer as pazes com ela. Me aproximei do papel e da caneta, mesmo depois da distância de alguns meses. Quem sabe hoje ela não me conta o que esse silêncio está querendo me dizer…


Sim, o barulho externo tem sido gritante ultimamente. Mas, e o silêncio interno, também não pode ser ensurdecedor?


Voltar a escrever é como andar de bicicleta. Logo você já sente a brisa tocando o seu rosto e se pergunta: “Por que é que eu demorei tanto?”


A escrita como forma de explorar a arte de ser eu mesmo é como esculpir com palavras, é uma pintura com letras e espaços em branco, é experimentar ritmos e brincar com rimas. É criar intimidade com as palavras, e depois deixá-las voarem por aí como bem entenderem. Ah, a liberdade!


Foi Miles Davis que disse: “Quando você toca uma nota errada, é a próxima nota que a faz ser boa ou ruim.”


Da mesma forma, quando se escreve uma palavra “errada”, o que a faz ser boa ou ruim é a próxima palavra, o contexto em que ela vive (ou em quem ela sobrevive).


E se o silêncio entre as notas é que constrói uma composição musical, é o silêncio entre as palavras que desenha um pensamento, que conta uma história e que compartilha uma alma.


Ouvir o silêncio (!)



de pass a  g   e    m

 

nas 



S



é 



tão necessário 



quanto (?)



as p.a.l.a.v.r.a.s



que {habitam}



NELAS

.

***

Kenzo Sugawara

“Curioso pela profundidade da vida com propósito. Escrevo para me encontrar e devolver algo de bom no mundo.”